O
tráfico humano é um crime que afeta cerca de 50 mil pessoas nos Estados
Unidos, segundo o Departamento de Estado. Nas ruas, bordéis, nos campos
de tomate da Flórida ou nas plantações de maçãs de Washington, nas
casas de famílias dos subúrbios e nas de diplomatas e altos funcionários
das organizações internacionais em Washington, D.C. São 12,3 milhões de
pessoas traficadas no mundo inteiro, diz a Organização Internacional do
Trabalho.
O lucro que é gerado no
tráfico humano é de US$ 31,7 bilhões por ano e é livre de impostos,
fazendo com que essa modalidade seja a terceira mais lucrativa do crime
organizado internacional, atrás somente do tráfico de drogas e armas.
Shamere
(foto) é uma sobrevivente do tráfico humano. Ela conta que conheceu um
rapaz chamado Corey, conhecido como ‘o Magnífico’ Davis. Ele era dez
anos mais velho que ela e tinha uma Mercedes. Eles começaram a namorar e
um mês depois já morando juntos, ele disse que poderia ajudá-la a ter
dinheiro para quitar sua dívida de US$ 3 mil com a faculdade, que ela só
precisaria dançar. Na primeira noite ela disse que teria dançado num
clube em New Jersey e mais tare Davis a teria levado para um apartamento
onde estava alguns amigos. Lá, um deles a pediu para fazer algo que ela
não estava esperando e Davis a obrigou que fizesse senão não sairia
viva dali.
Shamere chegou a fugir
três vezes, mas foi ameaçada de que matariam sua mãe, foi agredida
fisicamente e depois, quando conseguiu fugir novamente, foi definitivo.
Após isso, Corey Davis foi julgado e condenado a 24 anos de prisão por
tráfico de mulheres e crianças para prostituição. Mas Shamere caiu no
radar do FBI acusada de colaborar com Davis no tráfico e chegou a ficar
presa por três semanas, depois de ser interrogada e questionada , os
agentes do FBI constataram que ela não era uma comparsa, mas sim, vítima
de Davis.
Livre das acusações , ela
foi solta e foi encaminhada para um programa de recuperação de vítimas
de tráfico humano, no ‘National Human Trafficking Resource Center
(NHTRC)’, em Washington D.C. A capital americana é a sede das principais
organizações que lutam pelo fim do trabalho escravo no país e por leis
estaduais mais rígidas e penas mais longas para traficantes. Mas é
também palco de tráfico humano. “E bem debaixo do nariz dos políticos”,
diz a assistente social Tiffany Williams, da ONG Break the Chain
Campaign. A apenas dois quarteirões da Casa Branca, na Rua K e seu em
torno, fica a principal zona de prostituição da cidade. Ali, a polícia
metropolitana prendeu uma quadrilha que prostituía menores. Não muito
longe, entre os prédios comerciais e as tendas do movimento Occupy D.C.
que se acumulam na Praça McPherson, é fácil encontrar casas de massagem e
salões de beleza asiáticos. Estabelecimentos desse tipo foram fechados
por servir de fachada para a exploração sexual de imigrantes filipinas e
tailandesas. Já do outro lado da cidade, numa das áreas ricas da
capital, a Rua das Embaixadas, a servidão doméstica acontece até nas
casas de diplomatas e funcionários do Banco Mundial e do FMI. “Mas estão
protegidos pela imunidade diplomática, então não podemos encostar um
dedo neles”, reclama Tiffany.
O
governo americano criou 42 forças-tarefas regionais para tentar impedir a
punição das vítimas, como aconteceu com Shamere e formou policiais
especializados em identificar e ajudar vítimas de tráfico humano. O
policial Melvin Scott, comandante da Divisão de Narcóticos de
Washington, que integra a força-tarefa de combate ao tráfico humano na
capital americana, afirma que seu departamento tem sido “agressivo em
promover operações e investigações envolvendo casos de tráfico de
pessoas”, mas é muito difícil montar o processo se a vítima não quiser
depor.
Shamere teve sorte e escapou.
Recebeu a ajuda de que precisava e agora é ativista pelo fim da
escravidão moderna. Quer se tornar advogada de vítimas de tráfico
humano. No fim de outubro, participou de uma marcha com centenas de
manifestantes. Fez uma performance no gramado em frente ao obelisco
George Washington. Vestida com o roupão laranja dos presidiários
americanos e um pouco teatral, repetia: “Sou uma sobrevivente de tráfico
de pessoas. Sou sua vizinha, sua colega de escola. Posso ser a sua
filha”.
Fonte: O Estado de S.Paulo
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